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Eras de Ouro - Desafiadores do Desconhecido - Anos 50

Por Lucio Luiz

Paraíso Perdido

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No escritório dos Desafiadores do Desconhecido, numa manhã de janeiro de 1958, uma estranha figura se aproxima sorrateira. Ace Morgan está distraído, lendo no jornal a noticia sobre o último feito dos Desafiadores do Desconhecido, quando é interrompido por um pigarrear.

Ao olhar para trás, vê um homem de meia-idade, careca, de estatura mediana, levemente curvado e com um olhar distante.

— Quem é você? Como entrou aqui? — questiona o piloto.

— Meu nome é Jean-Luc Fernir. Preciso da ajuda dos Desafiadores do Desconhecido.

Nesse momento, os outros três desafiadores aparecem, querendo saber a origem daquele burburinho na sala em que Ace está sozinho.

— Ace, quem está aqui com você? — pergunta Red Ryan.

— É o que eu estava querendo saber. A porta estava trancada e de repente ele aparece aqui sem fazer nenhum barulho.

— Por favor. — o estranho visitante faz com que todos fiquem atentos — Sou arqueólogo e pesquisador do governo francês. Fiz uma descoberta fabulosa na África e preciso da ajuda de vocês.

— Nós só nos envolvemos em assuntos que apresentem desafios muito grandes. — interrompe Prof Haley — Do que se trata essa descoberta?

— Esteja certo de que é algo que os deixará estupefatos. Contudo, não posso falar nada agora. Preciso que vocês me acompanhem até Alto Volta (*). Minha pesquisa pode ser interrompida a qualquer momento e somente vocês podem me ajudar.

— Até onde eu sei, Alto Volta é colônia francesa. — comenta Rocky Davis — Por que você não solicita ajuda ao seu governo?

— Dentro de algumas semanas, Alto Volta terá sua autonomia dentro da comunidade francesa. O governo francês é muito burocrático e jamais me ajudaria a tempo. O desafio é muito grande e só vocês podem enfrentá-lo. Além disso, eu posso pagar muito bem.

Como jamais recusam um desafio, os Desafiadores do Desconhecido resolvem aceitar a proposta de Jean-Luc. Ace pilota o avião dos aventureiros até Alto Volta, no oeste da África. Eles não enfrentam maiores dificuldades para pousar Banfora, uma cidade no extremo oeste do país relativamente próximo ao monte Tenakuru.

O monte Tenakuru possui apenas 717 metros de altura, mas é o maior de Alto Volta. Durante algumas horas, os quatro desafiadores e o arqueólogo Jean-Luc escalam sem maiores dificuldades o lado oriental do monte. Pouco antes de chegar ao cume, o grupo pára e se encaminha para uma reentrância de formato oval.

O espaço é tão perfeito que parece ter sido feito por mãos humanas, embora Jean-Luc garanta que é uma formação rochosa criada pela natureza. Poucos metros após esse buraco, os quatro aventureiros se espantam ao perceber, em plena África, vegetação tropical cerrada.

Deixando a estranheza de lado e encarando uma dura caminhada mata adentro, os cinco homens chegam a um descampado do qual, ao longe, se percebe um muro.

— Como isso é possível? — questiona Prof — Ainda estamos no monte Tenakuru?

— De certa forma. — responde Jean-Luc — Isso que vocês vêem à sua frente é o segredo mais bem guardado de toda a história da Humanidade. É algo que há milênios não é visto por nenhum ser vivo.

— Milênios? — duvida Ace — Esse descampado e essa ilógica floresta tropical no meio da África, além daquele muro bem conservado ali adiante estão em segredo há milênios? Como ninguém jamais descobriu isso?

— Durante a caminhada até aqui, vocês não sentiram uma leve vontade de ir embora?

— Agora que você mencionou, senti algo parecido, mas preferi ignorar essa vontade.

— Exatamente por isso que eu precisava de vocês quatro. Vocês são as únicas pessoas que ignorariam a forte vontade de ir embora que esse local proporciona.

— Não estou convencido, mas tudo bem. — interrompe Red — Só que você ainda não disse do que se trata isso aqui.

— Olhem um pouco mais para a direita do muro.

Os Desafiadores do Desconhecido acompanham o muro com o olhar e ficam impressionados ao verem um portão gigantesco, provavelmente da altura de cinco homens, e, à frente, uma enorme figura, vestindo uma longa túnica branca e com seis asas gigantescas saindo de suas costas e cobrindo boa parte de seu tórax. Na mão esquerda, uma enorme espada cuja lâmina parece ser feita de fogo.

— Isso, meus amigos — explica Jean-Luc — é a porta do Jardim do Éden.

— Não faz sentido! — exclama Prof — A simples existência do Jardim do Éden jogaria por terra as teorias evolucionárias!

— Não necessariamente. — contesta Jean-Luc — O paralelismo dos dois acontecimentos pode muito bem ser considerado. O que impediria de haver um Jardim do Éden dando origem à humanidade como conhecemos, unindo os antepassados do homem com sua realidade atual?

— Como assim?

— Por que você acha que nunca foi encontrado o "elo perdido"? Exatamente porque a transformação do homem do que ele era na pré-história para o que ele é hoje ocorreu graças à intervenção divina.

— De qualquer forma, por que o Jardim do Éden está na África? Não diziam que seria na Mesopotâmia?

— As fontes para essa afirmação não são muito claras quanto a geografia. Minha teoria é de que o monte Tenakuru é uma espécie de portal para o Éden. Uma ligação entre o místico e a realidade.

— Certo, certo... — interrompe Red — O papo teológico está interessante, mas você não nos chamou aqui apenas para ver os portões do Paraíso, correto?

— Correto! Eu quero que vocês enfrentem o arcanjo para que eu possa ter acesso ao Jardim.

— Como? Você quer que nós lutemos contra um anjo?

— Lutar? Creio que me expressei mal. Preciso é de um artefato que me dará acesso ao local. Tenho que entrar no Jardim do Éden para concluir minhas pesquisas. Imaginem os avanços que os conhecimentos existentes naquele local não poderiam trazer para a humanidade! Transformaríamos a Terra num verdadeiro Paraíso!

— E onde encontramos esse artefato?

— Num rio a alguns quilômetros daqui. Precisava mostrar a vocês isso tudo antes para que não achassem que estou louco.

Ace está desconfiado de Jean-Luc. Não faz sentido convocar os Desafiadores do Desconhecido para uma tarefa que, para seus padrões, é até simples: buscar um artefato no fundo de um rio. Claro que a descoberta do Jardim do Éden se enquadra nos conceitos de "desconhecido" ao qual o grupo está acostumado. Mas ainda não viram os perigos mortais que o arqueólogo faz questão de citar.

No fundo do rio Volta Negro ao norte do monte Tenakuru, Prof Haley encontrou facilmente uma pequena arca descrita por Jean-Luc. Dentro da arca, havia uma espécie de vareta azul, do tamanho de um palito de picolé, com estanhas inscrições num alfabeto desconhecido. Curiosamente, o arqueólogo não encostou no objeto uma vez sequer, sempre apresentando as mais diferentes desculpas.

Os aventureiros voltaram a seu avião, levando a vareta que, segundo Jean-Luc, era uma espécie de "chave" para o portão do Jardim do Éden. Ele disse que a descobriu após diversas pesquisas sobre mitologia cristã. Quando começava a falar sobre esse assunto, o arqueólogo era tão chato, que os desafiadores preferiam deixar de lado suas dúvidas sobre como ele sabia a localização exata do objeto e coisas afins.

De volta à estranha floresta que circundava os portões do Jardim do Éden, Jean-Luc orienta Ace a apresentar a "chave" para o arcanjo.

— Por que você mesmo não leva a "chave"?

— Eu prefiro não aparecer na frente do arcanjo.

— Qual a razão?

— Devo admitir, eu sou um covarde. Chamei vocês porque eu morro de medo de conversar com o arcanjo da espada flamejante, sabe?

Ace então caminha em direção ao arcanjo com a "chave" na mão enquanto os outros três aventureiros fazem companhia a Jean-Luc.

Quem vem lá? — um som gutural, quase inumano, sai da boca do arcanjo.

— Meu nome é Ace Morgan. — responde, sem titubear — Vim pedir acesso ao Jardim do Éden.

— Minhas ordens são para guardar os portões do Jardim do Éden até que o descendente dos primogênitos de Adão venha reclamar sua reabertura. Volte de onde veio antes que eu lhe mate com a fúria divina.

— Eu tenho uma chave. — Ace mostra a vareta azul para o arcanjo.

Após pegar e observar atentamente o objeto durante alguns minutos, o arcanjo finalmente diz:

— Minha tarefa aqui está cumprida. — e voa bem alto, até desaparecer num raio de luzes coloridas.

Uma luz azul sai da chave em direção aos portões, que começam a abrir lentamente. Jean-Luc sai de seu esconderijo junto com os outros três desafiadores e regozija-se:

— Finalmente! Voltei! Voltei!

Diante dos olhos dos Desafiadores do Desconhecido, o pequeno francês torna-se um homem forte, de quase dois metros de altura. Sua pele fica avermelhada ao mesmo tempo em que seus joelhos dobram-se para trás e um enorme rabo pontudo surge em suas costas. Abriram os portões do Jardim do Éden para Lúcifer.

Antes que Lúcifer conseguisse passar pelos portões do Jardim do Éden, os Desafiadores do Desconhecido pulam à sua frente.

— Você não pode entrar aqui! — exclama Prof.

— Saia da minha frente, humano estúpido! — ameaça o Soberano das Trevas — Vocês tiveram sua utilidade, mas agora devo regozijar-me nas terras do Éden.

— Não se pudermos impedir! — contesta Ace.

— Tolo! Vocês caíram como crianças em minhas mentiras! Precisava de vocês apenas para pegar a chave que dava acesso aos portões do Éden e enfrentar Deus onde ele é mais acessível!

Lúcifer lança uma bola de fogo sobre os quatro aventureiros, que voam para dentro do Jardim do Éden e desmaiam.

Rocky Davis é o primeiro a acordar após o ataque de Lúcifer. Ele rapidamente reanima seus companheiros, que se espantam com a cena que vêem.

O Jardim do Éden não passa de um grande espaço escuro, com árvores mortas e secas e com uma vegetação rasteira que lembra a da caatinga. Rios vermelhos como sangue correm sob um céu escuro e repleto de nuvens ameaçadoras.

No centro desse local estranho, Lúcifer está ajoelhado ao lado de uma gigantesca árvore tombada. Os desafiadores se aproximam para ouvir o que ele diz.

Não! Tantos milênios esperando por esse momento! Tanto tempo fazendo um joguinho de gato e rato, brincando com Deus naquelas histórias de Jó e de outras criaturas humanas patéticas que precisavam provar sua adoração a Ele! Esse tempo todo tentando encontrar o descendente dos primogênitos de Adão para conquistar o poder e agora... o que eu tenho é isso!

Cada vez mais confusos, os desafiadores observam quando Lúcifer, num momento aparentemente de desespero, se agarra ao tronco caído da gigantesca árvore e solta um gemido de dor, transformando-se, diante de seus olhos, numa serpente. Em seguida, implode.

MEUS FILHOS! — uma retumbante voz surge do que parece ser todos os lugares ao mesmo tempo.

— Quem está aí? Apareça! — exige Ace.

ACE MORGAN, TU CONDUZISTE O DIABO ATÉ AQUI, MAS O PERDÔO, POIS NÃO SABIAS DE SUAS ARTIMANHAS.

— Você me conhece?

TU ÉS O DESCENDENTE DOS PRIMOGÊNITOS DE ADÃO, O ÚNICO SER QUE PODERIA APRESENTAR A CHAVE DE ACESSO AOS PORTÕES DO ÉDEN AO GUARDIÃO.

— Ei... Quem está falando é quem eu estou pensando?... — indaga-se Red.

SIM, RED RYAN. VÓS, QUE SOIS CONHECIDOS COMO OS DESAFIADORES DO DESCONHECIDO, ESTÃO NA PRESENÇA DAQUELE QUE TUDO CONHECE.

— Um minuto! — interrompe Rocky — Isso não faz nenhum sentido! O Jardim do Éden não era pra ser um lugar bonito e com todas as maravilhas do mundo?

A BELEZA DO ÉDEN DESAPARECEU À MEDIDA EM QUE, AO PECADO ORIGINAL, MUITOS OUTROS SURGIRAM NA HUMANIDADE. O JARDIM DO ÉDEN REVITALIZAR-SE-Á QUANDO SE INICIAR A NOVA ERA DA HUMANIDADE. E SERÁ NESSE MOMENTO QUE O FUTURO DESCENDENTE DOS PRIMOGÊNITOS DE ADÃO ENTREGARÁ CORRETAMENTE A CHAVE DE ACESSO AOS PORTÕES DO ÉDEN PARA SEU GUARDIÃO. NESSE INSTANTE, TODOS MEUS FILHOS ESTARÃO NOVAMENTE REUNIDOS NO VERDADEIRO PARAÍSO.

— Mas o diabo não tinha falado que aqui ele teria poder?

ELE FOI EXPULSO ANTERIORMENTE POR TER FEITO MEUS PRIMEIROS FILHOS DESVIAREM-SE DE SUA ROTA. AQUI, ELE POSSUÍA ENORME PODER, MAS SÓ O PERCEBEU APÓS SUA EXPULSÃO. CONTUDO, ELE SÓ TERIA ESSE PODER SE O ÉDEN NOVAMENTE PULSASSE DE VIDA.

— Quer dizer que você... digo, o Senhor quis que ele viesse aqui antes para que ele fosse destruído? — pergunta Prof.

— Então — continua Ace — tudo foi proposital? Isso tudo para que o diabo não estivesse por aqui quando o Éden voltasse ao normal?

E POR ACASO TUDO NÃO OCORRE DE ACORDO COM MINHA VONTADE? AGORA, VÃO, E ESQUEÇAM TUDO O QUE VIVENCIARAM AQUI.

No escritório dos Desafiadores do Desconhecido, numa manhã de janeiro de 1958, Ace Morgan está distraído lendo no jornal a noticia sobre o último feito dos Desafiadores do Desconhecido. Os outros três desafiadores aparecem, questionando sobre um burburinho na sala em que Ace estava sozinho.

— Ace, quem está aqui com você? — pergunta Red Ryan.

— Aqui? Ninguém. A porta está trancada, não tem como ninguém entrar. Vocês devem ter se confundido.

— Podia jurar que tinha ouvido algo. — complementa Prof Haley.

— Mas pelo visto não foi nada mesmo. — conclui Rocky Davis.

— Por falar nisso, temos alguma nova aventura para hoje?

— Não. Até agora ninguém entrou em contato conosco. Parece que não está acontecendo nada que exija a presença dos Desafiadores do Desconhecido.

Nesse instante, alguém bate à porta. Ace atende e vê um homem alto e jovem que imediatamente se apresenta:

— Bom dia, meu nome é Lucius Fight, sou um cientista britânico e fiz uma descoberta fabulosa na Ásia. É algo que apresenta um desafio muito grande e que os deixará estupefatos. Preciso que vocês me acompanhem até o Iêmen do Sul. Dessa vez, não há risco de erros.

— "Dessa vez"?

— Modo de falar. Vamos logo. O desafio é muito grande e só vocês podem enfrentá-lo. Além disso, eu posso pagar muito bem. Será uma aventura infernal!


:: Notas do Autor

(*) Alto Volta é conhecido atualmente como Burkina Faso (desde 1984). voltar ao texto



 
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