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Por
Fernando Lopes
Fechando
o Cerco
A polícia
apreendeu hoje um carregamento de armas e drogas avaliado em US$
1,5 milhão, numa casa abandonada em Parson Acres, no subúrbio.
O bairro, fechado há cerca de dois anos por causa da contaminação
do solo por lixo tóxico, vinha servindo de esconderijo
para a quadrilha de traficantes. Esta é a terceira grande
apreensão de drogas e armas só esta semana. Como
das outras vezes, um telefonema anônimo informou o esconderijo
dos bandidos à polícia.
Vic Sage sorriu interiormente ao ler as palavras que corriam no
teleprompter. Afinal, o "anônimo" informante não
era ninguém menos do que ele próprio.
Por enquanto, a estratégia de Sage para derrubar Sam Johnson,
o principal chefão de Hub City, corria conforme o planejado.
A idéia era simples: causar o maior prejuízo possível
a Johnson, de modo a deixá-lo frágil, para só
então atacar diretamente. As três apreensões
já tinham custado ao criminoso mais ou menos uns US$ 2,8
milhões. "O suficiente para deixá-lo irritado",
pensou Vic, satisfeito. "Só queria ver a cara do velho
agora."
Perdido em seus planos, Sage não percebeu que outra moça
viera trazer o café. Estava ocupado demais para perceber
que Consuela Rodriguez não viera trabalhar. Só mais
tarde ele se daria conta disso...

Alguém
quer me derrubar, Morton. E eu preciso descobrir quem.
Sam Johnson observava o neto brincar no jardim enquanto falava.
O cenho franzido acentuava o efeito do tom soturno em sua voz.
O que temos?
Pouco, senhor. retrucou Morton, disfarçando
o nervosismo Os bolivianos estão desconfiados e
querem receber antes de voltar a negociar. Perdemos muito poder
de fogo, já que a polícia apreendeu nossas armas
antes que pudéssemos repassá-las aos homens. Há
rumores de que a Máfia estaria recrutando gente nossa,
mas nada concreto.
Alguma idéia de como as informações
estão chegando à polícia?
Só... boatos, senhor.
Que tipo de boatos?
Nada que faça muito sentido... Parece que um sujeito
tem feito perguntas... Três dos nossos foram parar no hospital
com várias fraturas, dois outros saíram da cidade...
Um sujeito? Que sujeito? Tira? Federal? Que porra de sujeito?
Johnson socou a mesa, visivelmente furioso.
É aí que está o problema, senhor...
Morton tentava escolher as palavras da melhor forma possível
Ninguém sabe. Só se sabe que parece ser um
sujeito sem... rosto.
Como? Johnson estranhou a definição
Como assim, sem rosto? Quer dizer que não é
gente daqui?
Não, senhor. Morton esperava o próximo
rompante Quero dizer sem rosto, mesmo. Literalmente.
Johnson voltou-se para a janela. Aquela era uma informação
importante, embora a imbecilidade de Morton não o deixasse
ver. Um homem sem rosto? Alguém já tinha lhe falado
sobre um homem assim há algum tempo, mas não conseguia
lembrar quem. Subitamente, um nome lhe veio à cabeça:
reverendo Hatch, o louco que praticamente comandou Hub City há
alguns anos. Tiveram negócios juntos. Fora ele quem mencionara
ter removido um certo "empecilho sem rosto" do caminho.
Hatch estava morto e, ao que tudo indicava, seu "empecilho"
não havia sido removido direito. Ele até mencionara
o nome...
Questão...
Pois não, senhor?
Cale a boca, Morton. Seja útil e me diga como andam
as coisas com o projeto de zoneamento.
Tudo certo, senhor. O empregado sentiu-se feliz
em finalmente poder dar uma boa notícia O parecer
técnico já foi emitido e o projeto vai agora para
o Conselho, onde nossa maioria é garantida. Depois, bastará
a sanção da prefeita.
Ótimo. Isso...
Vovô!
Johnson foi interrompido pelos gritos do pequeno Timmy, que invadia
seu escritório com um sorriso.
Olá, meu príncipe. Vovô já fala
com você. disse Johnson, voltando-se para Morton
em seguida Quero resultados. Logo.
Sim, senhor.
Johnson começou a brincar com o neto, mas não conseguiu
focar sua atenção. O nome martelava em sua mente.
"Questão... Mas quem diabos é você"?

No cemitério,
Sage olhava para a sepultura praticamente abandonada. O nome de
Jerry Wilson parecia encará-lo de volta.
Johnson tirou tudo de você, amigo velho. Emprego,
casamento, dignidade... vida. Eu vou dar o troco.
E vai valer a pena?
Quem é você? perguntou Sage, assustado
com a chegada silenciosa do estranho Quer me matar do coração?
Ninguém importante. respondeu o forasteiro
de terno preto, camisa branca de gola alta, chapéu, sobretudo
e um grande medalhão pendurado no peito Não
pude deixar de ouvir o que dizia.
Pois você é um bocado intrometido, se quer
saber minha opinião...
Talvez. Mas tenho uma questão para você: é
mais importante vingar os mortos ou cuidar dos vivos?
Não sei do que você está falando, esquisito.
Eu vim aqui visitar o túmulo de um amigo... Sage
virou-se para a lápide por um segundo ... e você
aparece e...
Não havia mais ninguém com ele. Vic estava sozinho.
"Estou pirando", pensou. "Definitivamente, estou
precisando de férias..." Saiu do cemitério
com a nítida sensação de que era observado
e apressou o passo. À distância, o Vingador Fantasma
acompanhava o repórter com os olhos, rezando para que seu
aviso tivesse surtido efeito.

O promotor Robert
Gallagher saiu do fórum absorto em suas próprias
idéias. Pensava numa forma de ligar os nomes dos traficantes
presos ao crime organizado, mesmo sabendo que isso poderia lhe
custar o cargo ou algo pior. Se, porém, não fizesse
nada, perderia a melhor chance de sua carreira de concorrer ao
governo do Estado nas próximas eleições.
Dirigia há uns cinco minutos quando, pelo retrovisor, viu
o homem sem rosto que o observava no banco de trás. Soltou
um grito de puro pavor.
Olá, senhor Gallagher. Precisamos conversar.
Q-quem é você? O que quer? E-eu não
tenho dinheiro!
Não seja ridículo. disparou o Questão,
chegando para frente Continue dirigindo. Vim lhe propor
um negócio.
Q-que tipo de negócio?
Do tipo que pode alavancar sua carreira política.
Como assim? a conversa subitamente tornara-se interessante.
Vou lhe entregar provas definitivas ligando Samuel Johnson
ao tráfico de drogas, armas e outras sujeiras. Material
irrefutável. Interessado?
Talvez. Precisa ser coisa muito boa para colocar o Negociador
na cadeia. Ele tem quase todo mundo no bolso...
Inclusive você?
É evidente que não! Gallagher fez
ares de ofendido Que espécie de homem...
Do tipo que venderia a própria mãe para se
eleger.
Isso é um absur...
Cale a boca, Gallagher. Diga apenas sim ou não.
Temos um acordo?
O promotor pensou por alguns instantes.
Se a coisa for quente como você diz, sim.
Não se preocupe.
Mas como eu vou... disse Gallagher, parando no semáforo.
A porta traseira estava aberta e o banco de trás, vazio.
:: Notas do Autor
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