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Por
JB Uchôa
Estranhas
Escrituras
Gateway City,
Embaixada da Grécia, II Conferência de paz mundial
feminina.
Palestrante: Princesa Diana, a Mulher-Maravilha.
"...as amazonas não pregam um mundo que seja dominado
pelas mulheres, e sim um mundo de paz, onde as mulheres tenham
poder de voz e ação. Que não sejam subjugadas
pelos homens, porque todos somos iguais." Em meio
aos aplausos, Diana sente-se pouco à vontade. Apesar de
ser membro da Liga da Justiça, seu papel no mundo é
levar a mensagem das amazonas, uma mensagem de paz, amor, união
e igualdade.
Muito bem, Diana, falou muito bem. agradece Helena
Sandsmark, curadora do Museu de Cultura Antiga de Gateway
Notei que você ficou hesitante por um momento. Já
não tinha preparado o discurso?
Falar das amazonas é algo que vem do coração.
Mas você está certa, Helena, hesitei por um momento.
Pensei ter visto a deusa Atena na platéia.
Uma deusa grega? Aqui? Helena assume um ar de espanto
e excitação. Como estudiosa da Grécia, conhecer
uma divindade grega seria uma honra inigualável.
Sim, preciso verificar isso. A princesa alça
vôo no meio do auditório. Para os mais afoitos, ela
talvez esteja atendendo um chamado da Liga; para os invejosos,
é só mais uma vigilante se mostrando perante os
humanos comuns.
A embaixada grega possui várias estátuas de deuses:
Pan, Hera, Zeus... mas nenhuma se compara à perfeição
das que existem na Ilha Paraíso. Diana contempla a imagem
de Atena e pensa que talvez seja a hora de voltar para casa. Há
muito não dá notícias do mundo do patriarcado,
que tanto alegram Hipólita e Philippus. Também sente
falta da roda que se forma quando ela chega, com suas irmãs
amazonas querendo que ela conte suas aventuras na Liga, os mundos
que conhecera, vilões que derrotara. Para a princesa, voltar
ao lar não é uma obrigação, é
um prazer. Para quem cresceu rodeada de mil mães, é
uma benção ter um lugar que chama de lar, e onde
todas estão juntas.
Viu algo, Diana? pergunta Helena, preocupada.
Não... Pode ser apenas saudades de casa, ou talvez
Atena tenha algo para mim.
Talvez tenha sido atraída por suas belas palavras,
que encorajam qualquer mulher em um mundo de homens.
Talvez... responde Diana, com o sorriso ingênuo
que nunca saíra de seu rosto com o passar de tantos anos.
Museu de Gateway City, Mostra de História Greco-romana.
Os romanos adoravam nossos deuses, mas os chamavam por
outros nomes. Talvez não quisessem admitir que a cultura
grega era superior à deles. Essa peça é grega,
Helena, e muito antiga. Ela cultua Apolo, era posta em seu oráculo
em Delfos, junto com oferendas para trazer alegria à vila.
Certamente cultuando às artes e músicas.
Aprendi muita coisa na faculdade, em livros e viagens,
Diana, mas nunca seria uma curadora tão eficiente não
fosse pela sua ajuda. Você sabe tudo, é sua história,
não tem que estudá-la. Helena Sandsmark se
sente grata. Passara anos debruçada sobre livros cheios
de poeira, manuscritos em grego antigo apenas para mostrar algo
à Mulher-Maravilha e ouvi-la responder com tanta naturalidade
quanto sua filha fala de namorados e tendências da moda.
Não reconheço esse dialeto, Diana. Sei que
é grego, mas não compreendo. Ao mesmo tempo
em que puxa de uma sacola de flanela um pedaço de mármore,
gravado com letras de ouro, e entrega à princesa.
Nunca tinha visto algo parecido, Helena, é grego
sim, mas muito antigo. Pelo que entendo, é uma peça
de adoração a Ares. Povos bárbaros, homens,
cultuavam o Deus da Guerra antes das batalhas. Pediam força
e determinação, para que não caíssem
diante de lanças mortais e espadas flamejantes. Na verdade,
para Ares não importava qual lado vencesse, se fosse uma
batalha entre cidades gregas. Para ele simplesmente a guerra,
a matança desenfreada e sem sentido, a cólera é
que importava. Ares se alimenta de dor e ódio. Já
havia visto peças de adoração ao Deus da
Guerra, mas nunca uma tão bonita. Geralmente são
em mármore negro, pedras, ou tábuas. São
feitas por guerreiros, não por artesãos. Essa peça
é delicada, bela. A única conclusão a que
posso chegar é que não foi feita por um guerreiro,
mas por alguém que buscava vingança.
Vou colocá-la perto das armaduras e armas. Faria
uma boa referência. Traduza a mensagem, Diana, para as pessoas
saberem o que está escrito. Essa peça faz parte
do acervo do museu, mas nunca foi exposta antes.
Não, Helena. Não colocarei dizeres que exaltam
o Deus da Guerra. Deixe-me levar o artefato à Ilha Paraíso.
Com certeza Philippus e minha mãe poderão me dizer
mais sobre essa peça.
Claro. Helena sabe que Diana já viu peças
mais bonitas, com significados mais ocultos, e nunca tinha se
negado a deixá-las expostas, mesmo orações
ao deus Ares. Mas essa parece ser diferente, tem algo que a incomoda.
Quando vai partir, Diana?
Talvez amanhã ao anoitecer. Não sei quanto
tempo vou passar lá. Tenho que informar ao Super-Homem,
ou ao Ajax que estarei na Ilha Paraíso, caso a Liga precise
de mim. Agora, se me permite, gostaria de fazer uma ronda antes
de ir para casa.
Claro, Diana. Ficarei aqui um pouco mais, a exposição
reabre em poucos dias e quero adiantar o trabalho para tudo sair
perfeito. Não vou mais precisar de ajuda, obrigada.
Nos vemos em casa. Não irei à Ilha sem falar
com você.
Com um aceno da profª. Sandsmark, a Mulher-Maravilha sai
voando do museu. Às vezes, somente às vezes, ela
acha que deveria agir como alguém normal, sair sem ser
pela janela, ir andando... mas ela não é alguém
normal, ela é a Mulher-Maravilha, a eleita das amazonas.
Prometera que evitaria ficar de uniforme no museu, para não
atrair atenção. Sua fisionomia muda quando pensa
no artefato. É uma peça muito delicada, trabalhada
em ouro puro e mármore de boa qualidade. Somente reis poderiam
mandar fazer tal peça de valor... reis ou rainhas. Em cima
do trono de sua mãe existe um símbolo que exalta
Deméter, Afrodite, Atena, Ártemis e Héstia,
as cinco deusas responsáveis pelo surgimento das amazonas.
Um símbolo em mármore, trabalhado com ouro puro.
Cais do
porto, zona de prostituição e baixo meretrício
de Gateway City.
A Mulher-Maravilha
acha essa ronda noturna sagrada, desde que chegara a Gateway City
ela procura toda noite sobrevoar os bairros mais longínquos
e perigosos. O cais é o pior deles. Já tentara diversas
vezes afastar suas irmãs mortais daquela zona, mas elas
sempre voltam. O máximo que pode fazer é observá-las
para que não sejam violentadas contra a vontade. Luzes
vermelhas e azuis chamam sua atenção. Uma batida
policial, nada trágico a princesa espera. Descendo como
um anjo, a Mulher-Maravilha ouve uma voz conhecida chamá-la
pelo nome de batismo.
Diana! O policial a quem Diana chama pelo primeiro
nome trata a princesa como uma velha conhecida. É o que
acontece quando se luta lado a lado contra as hordas de Darkseid.
Mike! Espero que não sejam problemas sérios.
Infelizmente sim, princesa. Traficantes de drogas estão
encurralados nesse armazém, mas tememos abrir fogo por
causa da refém.
Mulher-Maravilha... A situação está
sob controle, vocês chamados super-heróis só
tendem a piorar a situação. A Capitã
Jane Sontoya detesta a intervenção de meta-humanos.
Preocupem-se com suas crises estelares e demônios
que vocês mesmos trazem ao mundo real. Nós, os heróis
de verdade, cuidaremos de casos mais "mundanos".
E a Capitã vira as costas para a princesa como se nunca
estivesse estado ali.
Hã....desculpe Jane, Diana...é que a situação
está delicada lá dentro.
Tudo bem Mike, mas por vias das dúvidas eu ficarei
por aqui. Como uma prece, ou maldição, quando
a princesa amazona termina a frase tiros ecoam de dentro do armazém.
Os policiais armam barricadas, enquanto a Capitã Sontoya
grita para não abrirem fogo. Quando os tiros cessam, a
princesa sobrevoa o armazém como um anjo vingador, apenas
observando e esperando o momento de agir.
Nós temos uma refém aqui! É melhor
vocês saírem devagar e nos deixar partir em paz!
A voz vinda do armazém soa temerosa, mas do alto
a Mulher-Maravilha nota que é verdade. Sem lembrar das
grosserias de Jane Sontoya, a princesa amazona adentra o armazém
para resgatar a refém. Os bandidos ficam assustados com
sua presença. Os cabelos negros beijados pelo vento, os
olhos azuis como o mar Jônico e o corpo de uma sílfide
os deixam quase petrificados. Apesar de um segundo fazer alguma
diferença, tiros são dados em direção
à princesa. Como um relâmpago prateado, os braceletes
forjados por Hefestos desviam as balas. O Laço da Verdade,
também forjado pelo deus Hefestos, a partir do cinturão
de Gaia, enlaça os traficantes. Nesse mesmo instante, quando
Diana segura em seus braços a prostituta assustada que
fora usada como refém, os policiais adentram o armazém...
Mulher-Maravilha! Nós podíamos conter esses
traficantes! Esbraveja a Capitã Sontoya, enfurecida
com a intromissão de Diana.
Com toda certeza, Capitã. Desculpe-me se agi prematuramente,
mas a vida de uma irmã corria risco. Graças a Ártemis,
que me guiou com segurança e rapidez, ninguém saiu
ferido.
Diana, já está indo?
Já Mike, vou para casa...
:: Notas
do Autor
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