hyperfan  
 

Imagine Homem-Aranha

Por Dell Freire

Por Onde Andará J. Jonah Jameson?

:: Sobre o Autor

:: Edição Anterior
:: Próxima Edição
:: Voltar a Imagine...
:: Outros Títulos

As pessoas que caminham lá embaixo, em meios aos prédios imensos que parecem sufocá-las com a poluição presente em Nova York, mal percebem que estão sendo observadas com zelo por um homem que se impôs a responsabilidade diante de outras vidas que não a sua. Você é esse homem. Agachado no alto de um prédio, enquanto observa os transeuntes lá embaixo, seu pescoço se flexiona para a esquerda e a direita, como se estivesse tentando relaxar os músculos; seu velho uniforme azul e vermelho parece incomodá-lo especialmente hoje. Por que não deixar outros fazerem esse serviço. Por que você?

Com a agilidade natural de uma aranha, você dá um salto em direção ao ar, totalmente consciente de cada gesto, cada ação de seu corpo. Com um aperto suave de seus dedos, a teia de aranha desliza para fora de seu uniforme, parecendo que sai de suas mãos, e vai se grudar firmemente em um outro prédio mais à frente. Balançar de teia em teia faz suas preocupações parecem menores. Faz você parecer cada vez mais com os homens lá embaixo, preocupados com suas esposas e seus trabalhos.

Quando chega ao chão, imediatamente seus pés vão até a parte inferior de uma sacada e, coberta por um punhado resistente de teia, está sua bolsa com seu material de trabalho do Clarim Diário. Rapidamente, grudado na parece lateral, retira seu uniforme e vai amassando-o desajeitadamente em sua bolsa até restar simplesmente sua máscara vermelha, que olha para você do fundo de sua bolsa, quase parecendo sorrir, quase parecendo debochar por tê-lo em suas mãos.

Parker! Por que está tão atrasado? Não pense que te pago para ficar o dia inteiro passeando por Nova York! — na porta de entrada do Clarim Diário, seu amado e compreensivo patrão lhe espera com o charuto aceso e as boas-vindas habituais.

Acostumado a engolir sapos desde que começou a trabalhar com J. Jonah Jameson, seu único gesto é se desculpar, fazendo uma piadinha logo em seguida. Largando uma baforada e lhe olhando de lado, o editor do Clarim Diário parece não estar nos seus melhores dias... "Bem, na verdade, ele nunca está" — pensa você, enquanto se dirige até o elevador, junto com Jonah.

Pouco antes da porta se fechar, um homem imenso, roupas desalinhadas e mastigando o primeiro pedaço de um hambúrguer completamente gorduroso, coloca seu imenso braço para interromper a saída do elevador e, numa agilidade insuspeita, pula para dentro dele em meio a uma respiração ofegante.

— Onde fica o consultório do dentista? — uma nova mordida no hambúrguer é dada.

— Dentista?! — você não deixa de se surpreender, enquanto ajusta sua máquina fotográfica Nikon — Aqui não funciona nenhum consultório, você está no prédio do Clarim Diário.

— Não. Tenho certeza que é esse mesmo o endereço!

— E o que diabos acredita que isso seja, afinal? — bafejando como um louco, J. Jonah Jameson retira de suas mãos a máquina fotográfica e a esfrega na cara do homem — Uma broca à laser?

De repente, o elevador dá uma sacudidela e pára. Seu instinto de aranha começa a tilintar, como quase sempre faz, lhe causando um pouco de dor de cabeça; o desconhecido deixa o hambúrguer cair no chão e, imediatamente saca uma arma, parecendo partilhar do mesmo instinto para o perigo.

— Há algo errado aqui. — o detetive Harvey Bullock esquece completamente que é um homem de férias em Nova York ao sacar seu distintivo de policial, onde se lê "Gotham City PD", e sua arma.

— Agora sei por que sua cidade está infestada de loucos. — Jameson mastiga a ponta do charuto — Não está vendo que é apenas uma pane?

Subitamente, o elevador volta a subir com os três integrantes e sua camisa começa a ficar marcada por algumas gotas de suor. Depois de uma ronda noturna balançando de teia em teia pelas ruas de Nova York, a última coisa que desejaria encontrar seria mais alguma ameaça exatamente dentro do prédio do Clarim Diário. Alguns minutos mais longos que o usual terminam.

A porta do elevador se abre. Uma arma automática surge, apontada diretamente para o rosto do editor do Clarim Diário.

— Solte a arma, gorducho! Se não quiser ver sua camisa com mais sujeira além desse ketchup envelhecido.

Batimentos cardíacos cada vez mais fortes de J. Jonah Jameson. Três homens e uma mulher espalhados pela sala, de forma ameaçadora. Seu instinto oscila entre a ação e a espera do momento propício. O mais velho entre eles puxa Jameson para seu lado e faz um sinal com a cabeça para irem embora. Ao ver Bullock desarmado tentar reagir e levar um violento murro que o faz desacordar em instantes, você vê apenas uma saída.

Com uma tentativa desastrada, simulando uma inexperiência em combate, você se atraca com o homem que aparenta ser o mais fraco entre todos... consciente de que está fazendo uma cena, ainda assim ele lhe surpreende ao conseguir aplicar uma seqüência de golpes em seu estômago.

Parker! Homem de Deus, não reaja! — Jameson surpreende a todos ao demonstrar preocupação — Aonde vou achar um fotógrafo que trabalhe pelo seu preço??

Os outros funcionários aparentemente ficam em estado de choque, apreensivos com o que pode lhe acontecer e temerosos diante de sua coragem repentina. Um filete de sangue sai do canto de sua boca com o murro que o homem desfere. O impacto faz com que você cambaleie para trás; claro que a força do homem não é tanta, mas não lhe resta alternativa.

Simulando estar mais zonzo do que realmente está, seu corpo inicia uma dança desajeitada em direção à janela, parecendo, para olhos desatentos, tudo ser fruto da luta. O estalo do vidro da janela é enorme, seu corpo a atravessa mais rapidamente do que os outros podem prestar atenção. Gritos e sussurros se iniciam ao ver a queda iminente até o chão, vários metros abaixo.

— Eu realmente estou apaixonada por Nova York!

— Ellen... Vai acabar me fazendo sentir ciúmes dessa cidade! — em meio a risos e abraços apertados, Buddy Baker e sua esposa Ellen passeiam de mãos dadas; logo atrás, seus filhos Cliff e Maxine começam uma implicante disputa pelo final de uma embalagem de doces.

O impacto de seus filhos diante da nova cidade foi melhor do que o esperado. Toda a família Baker adaptou-se perfeitamente à nova cidade. Aparentemente, ser um dos Vingadores (*) em Nova York não apenas lhe traz alguma estabilidade financeira e profissional, como também familiar. Mas em alguns momentos, sua outra vida interfere em seu cotidiano e a família.

Caraca!!! — o jovem Cliff se surpreende quando vê um carro a toda velocidade passar diante deles, sendo seguido por uma viatura policial — Isso é duca!!!

— Isso não é bom sinal... Acho que posso dar adeus ao nosso passeio no parque, certo? — o tom desolado de Ellen só é menos intenso do que o aperto de sua pequena filha Maxine aos seus pés, com medo da violência.

— Desculpe, Ellen. Também é minha responsabilidade.

— Pode ir, querido. — com um beijo em seu marido, ela se despede, não tão segura de aceitar essa vida. Porém essa não seria a melhor hora de discutir isso.

Putz! Demais! — o garoto estica o braço ao máximo, pulando alucinadamente — É o Homem-Aranha!

Você não pode ser repreendido por não ouvir o grito dos seus poucos e entusiasmados fãs enquanto se balança de teia em teia em uma perseguição tão veloz quanto possível aos dois carros. A vida de seu patrão está em jogo e você nem ao menos sabe o porquê.

— Cara! Ele é demais! — Cliff dá fim nas últimas guloseimas, já esquecidas por uma assustada Maxine — Ele é meu herói!

Ele?! — o Homem-Animal não consegue esconder a surpresa — Pensei que...

— Pô... desculpa, pai! — meio sem jeito, Cliff engole seu último doce — Também te adoro, mas é diferente... Nunca fizeram um desenho animado contigo...

Depois de passar pelo carro da polícia, que havia batido durante a perseguição, você percebe que a cada momento as coisas passam cada vez mais a estar em suas mãos. Uma pequena fisgada lhe incomoda o braço; talvez o seu impacto contra a janela tenha sido mais forte do que imaginava.

À sua frente, o carro dos homens que levaram Jameson, sem motivo aparente, começa a dar sinais de falha e, poucos minutos depois, pára. Um pouco exausto pela perseguição, seus músculos tentam relaxar e seus pés chegam ao chão, preparado para a luta que deve se seguir.

— Seja bem-vindo, Aranha — do banco de trás, o homem mais velho, cabelos grisalhos compridos, sai com uma faca pressionada levemente contra a garganta de J. J. Jameson — A Sociedade da Aranha fará esse sacrifício em nome de sua honra; sei que a paga será pequena diante de anos e anos de humilhação que sofreu por este homem!

— Ah, não... — quando sente do que se trata, você quase deseja não ter saído de casa hoje — Eu mereço...

— Eu sabia!!! — mesmo ameaçado, Jameson não perde seu "bom humor" característico — Cedo ou tarde, você e seus seguidores iriam querer a forra; a essa hora, novas viaturas devem estar a caminho!!! Assassinos!!!

— É chegada a hora! — aplicando um pouco de força na faca, o líder religioso faz escorrer um filete quase imperceptível de sangue do editor.

Pego de surpresa pelo inusitado da situação, existem poucos segundos para sua reação; porém, do alto, uma figura se antecipa e cai rapidamente logo atrás do líder da gangue, segurando-o por debaixo das axilas, afastando-o de Jameson para então tomar novo impulso em direção à parede. Gruda-se como se fosse uma aranha.

— Caminho livre. Sua vez!!! — berra o Homem-Animal, aproveitando-se de seus recentes poderes de aranha.

— Esse não é o verdadeiro Homem-Aranha! Matem esse impostor!

Com grande habilidade, você se desvia de um soco do maior adversário entre os três comparsas; em um salto, apóia-se na careca do gigante, ficando atrás de suas costas:

— Corrupio, pio, pio! — quando o careca se vira em sua direção, um violento soco o espera no meio do rosto, levando-o inconsciente contra a parede — Na careca do titio!

Incrível! — após abandonar o líder do grupo desacordado, Buddy Baker se junta a você — Você é mais infame que Ted Kord... (**)

— Anos e anos de prática. — sua teia é lançada, envolvendo as pernas da mulher e arrastando-a em sua direção — Agora, veja e aprenda como agarrar a mulherada!

— Eu fico com o cara!

— Cada um na sua; viva e deixe viver! — antes que você possa perceber a cara de insatisfação de Baker após a piada, a mulher demonstra ser uma adversária mais perigosa, lançando pequenos shurikens em sua direção — Ei, vamos com calma, gatinha.

Com uma pequena batida entre seus sapatos, a mulher faz surgir uma lâmina na ponta de cada um deles, rasgando imediatamente a teia que a prendia.

— Ei, você não sabe brincar! Essa não é uma teia comum pra você ir cortando...

— A brincadeira começa agora, farsante.

Respirando fundo, você se recrimina por ter que enfrentar a mulher; a alguns metros, o Homem-Animal e sua ajuda repentina parecem estar fazendo frente a um homem armado com um nunchaku. Esses poucos segundos de desatenção são suficientes para que você leve uma joelhada nos testículos, inclinando um pouco o corpo, enquanto a mulher pula em sua direção numa seqüência de chutes e socos desnorteantes. Com suas mãos, alguns golpes são aparados. Um objeto brilhante e cortante surge.

— Vai apanhar de mulher, Aranha? — com uma voadora aplicada com seu pé direito, Buddy Baker atinge as costelas do adversário, aparentemente não tão hábil com a arma oriental — Se quiser uma ajuda...

— OK, já chega! — em seguida, a lâmina cortante atinge seu peito, rasgando boa parte do seu uniforme.

Novamente, a lâmina voa em sua direção, mas o alvo agora é seu rosto; com a mão, você segura o braço armado da mulher e o vira, ouvindo em seguida um pequeno estalo.

Argh... Desgraçado... — a mulher se ajoelha, sem reação, o braço deslocado.

Os olhos dela olham para suas mãos espalmadas. Ela pisca diversas vezes quando uma incessante quantidade de seu fluido de teia de aranha cobre-a por inteiro; dessa vez, sem querer novas surpresas, você se certifica de ter material suficiente ao redor da sua adversária.

— Tá... — o Homem-Animal aproxima-se — Os poderes de aranha até que eu imagino como mimetizar... Mas como você consegue a teia?!

— Desculpa aí, amigo. É segredo profissional. — repentinamente, você se dá conta de que se esqueceu de algo — Mas... cadê o J. Jonah Jameson?

GANGUE DE ARACNÍDEOS DESBARATADA POR VINGADOR!

O jornal jogado em seu colo não lhe surpreende; mas, com certeza, torna seu café ainda mais amargo. Ao seu lado, Mary Jane aperta seu braço, encostando a cabeça suavemente.

— Não sei como você agüenta...

— Eu também não... Salvei a vida dele, mas não ganho nada em troca. Só acusações.

— Sabe... Às vezes acho que ele sabe... — diz ela, para sua surpresa.

— Como assim?

— O jeito como Jameson te trata... Nesses anos, nunca questionou seus atrasos... Um jornalista que se atrasasse e desonrasse tanto compromissos quanto você estaria demitido.

— Mas Robertson...

— Robertson é um subordinado. Mesmo essa fixação em seu alter ego é suspeita. Já pensou nisso? Talvez ele realmente tenha medo de você, mas também muita curiosidade e respeito por esse jovem que trabalha ao seu lado e que se tornou responsável por centenas de vidas.

— Mary Jane... O que tem nesse café da manhã?? Não vê que ele odeia o Homem-Aranha? Quanto a mim, sabia que ele não fez uma única pergunta sobre meu estado depois de despencar da janela? Nem deu atenção às minhas desculpas de que o Aranha teria me salvo...

— Desculpe, Pete. Só estou pensando alto. Mas, sabendo ou não sua identidade, o velho J. Jonah Jameson sente muito respeito por você. Mas jamais admitiria isso. Talvez...

Com um avanço mais rápido do que diante de qualquer supervilão, você a segura pelos braços e a puxa para si. O contato próximo com sua mulher envolta em um baby-doll faz seu sangue ferver e levam seus maus pensamentos para longe.

— Pete... hummm... Pete... hummm... — ela te afasta — Esqueceu?

— Ah, não... Não vai me dizer que ele não deixou de nos espionar??? — Você se levanta na cama, irritado e olha para fora da janela — Ele ainda está lá? No prédio ao lado?? Eu já não dei uma dura no enxerido do senhor Cardoso??

— Não sei. É bom não facilitarmos... Feche as cortinas. — responde Mary Jane, envolta em suas cobertas.

— Acho que vou pedir ao nosso amigo aracnídeo que faça uma visita a esse tarado, esse voyeur do 401...

Você fechas as cortinas e, ao se virar para ela, não deixa de abrir um sorriso. Ela retribui e te leva em instantes para o paraíso.


:: Notas do Autor

(*) No título regular dos Vingadores, Buddy Baker, o Homem-Animal, é integrante fixo da equipe. Não deixe de ler!

(**) Ted Kord, o Besouro Azul.



 
[ topo ]
 
Todos os nomes, conceitos e personagens são © e ® de seus proprietários. Todo o resto é propriedade hyperfan.