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Por
Josa Jr.
O Assassinato de Roger Ackroyd
"Péssima notícia. Péssima mesmo."
Ira Ackroyd confessa assassinato do pai. Mais detalhes após os comerciais.
"As palavras saem quase mecanicamente de minha boca. O mal-estar em divulgar esse tipo de notícia é tão grande que às vezes prefiro esquecer o que estou lendo. Como o jornalista Vic Sage, estive presente no local do crime, pouco depois de um vizinho ter escutado os tiros vindos da casa e ligado para o 911. Como Questão, usei meus contatos na polícia de Hub City para entrar na residência dos Ackroyds e analisar melhor o corpo da vítima. Um tiro no ventre, outro no peito e mais um na perna. Izzy O'Toole acredita que o garoto era ruim de mira, mas usou uma arma para resolver seus problemas com o pai."
"Todos os jovens têm problemas com os mais velhos. É típico da idade. Óbvio. Mas eu gostaria de saber mais. Gostaria de saber o que levou este rapaz de dezessete anos ao extremo de disparar contra o próprio pai. Minha intuição diz que não se trata apenas de rebeldia juvenil, e a curiosidade fará o Questão investigar o caso mais tarde."
Estamos de volta, Vic.
Hoje, por volta das 14 horas, Ira Ackroyd confessou ter assassinado o próprio pai, Roger Ackroyd, há dois dias atrás. O comissário de polícia O'Toole nos informou que o jovem confirmou ter desentendimentos com o pai.
"Um homem sem rosto grita em protesto. Eu prefiro ignorar os devaneios de minha mente e prossigo lendo a notícia. Mas preciso de respostas. Continuo a ler."
Num momento de descontrole, Ira pegou um revólver calibre 38 pertencente a Roger e disparou contra ele. Ira Ackroyd responderá por assassinato e está sob custódia do Estado.
"Finalmente, após o noticiário das oito, vou até o departamento de polícia em que Ackroyd está preso, com a desculpa de fazer uma entrevista com o garoto. Não é horário de visitas, porém consigo conversar com ele numa sala separada. O chefe do local me dá apenas dois minutos, referentes aos 15 dólares que eu tinha na carteira."
Eu conheço você. o garoto se assusta com minha presença. Talvez ele esteja mais assustado com tudo o que está acontecendo. Mas não me importo com essas questões. Quero apenas o motivo. O repórter, né? Veio me entrevistar?
Mais ou menos isso, Ira. Você tem irmãos?
Não, sou filho único.
Hmmm. E sua mãe?
Ela não mora conosco há uns três meses.
Você sabe por que eles se separaram?
Não sei. Brigas, talvez. Provavelmente sexo ruim.
"Ele não parece ter pudores ao falar dos pais. Uma pena. Demonstra que não teria tanto receio em matá-los. Seus olhos demonstram coisa pior ele mente. Não sei o que ele esconde, mas preciso saber. Talvez a mãe seja a chave. Preciso saber."
Você matou seu pai porque ele o afastou de sua mãe? o tempo se esgota. Preciso ser direto.
Não. Eu o matei porque ele era um babaca.
Não fale assim. odeio a ingratidão de quem tem a sorte de conhecer os próprios pais Ele era seu...
Ele era um babaca. Um puto. Um merda.
"Não sei por que me envolvi nisso. A vontade que tenho é de bater nesse moleque mimado e mostrar-lhe o que é a vida. Os Ackroyds viviam num berço de ouro Fortuna, um dos novos bairros de Hub City, habitado em sua maioria por novos-ricos ou emergentes. Preciso voltar à casa deles e investigar melhor o local. Antes porém, darei atenção especial a outra peça do tabuleiro Amanda Ackroyd, a mãe de Ira. Izzy pode me informar melhor. É hora de o Questão entrar em cena."

Izzy.
Merda!
"Eu poderia educadamente tocar a campainha. Mas o susto que o homem sem rosto causa nele é hilário. Prefiro entrar pela janela da sala enquanto ele assiste TV. Desligo o aparelho e sento-me em uma das poltronas."
Já disse pra você parar com essa mania de me dar sustos, seu palhaço. Que cê quer dessa vez, descarado?
O que sabe sobre Amanda Ackroyd?
Quem?
A ex-esposa de Roger Ackroyd. Mãe de Ira. Logo se vê o ótimo trabalho que você empreende nesta cidade, Izzy.
Hmpft. Eu sei quem é, mas não havia necessidade de incomodar a mulher se o moleque confessou o crime, babaca.
Não é questão de justiça. Eu apenas quero saber mais sobre o caso.
Quer, não! Você precisa saber mais! Essa sua mania de curiosidade vai acabar destruindo seus neurônios, heroizinho.
Eles já estão destruídos por sua preguiça, comissário. eu realmente não sei por que me envolvi nesse maldito caso. Na verdade, sei sim Me passe ao menos o endereço da garota. Ou serei obrigado a lhe dar mais do que um susto.
Saco. Aqui está.
Cuidado, O'toole. Esses seriados vão acabar destruindo os seus neurônios.
Vá à merda!

"Preferiria conhecer logo Amanda Ackroyd, porém o bairro de Fortuna é mais próximo do que o endereço que Izzy me deu. Chego à cena do crime por volta das dez e meia. Apenas um policial guarda o local, e ele é desatento demais para perceber minha entrada na casa. Revisto todos os cantos da residência, começando pelo primeiro andar e chegando até os quartos, na parte de cima."
"Sem vestígios de droga no quarto de Ira. Seu computador não mostra nada de estranho. Uma TV, um aparelho de DVD, muitos CDs de rock. Péssimo gosto. Muitas camisas quatro com o símbolo da Microsoft. Muitos tênis ele calça 41. Uma câmera digital e dois skates. O garoto tinha tudo. Preciso saber mais."
"Vou até o quarto de Roger, não sem antes passar pelo desenho a giz de seu corpo no chão do corredor. No quarto do homem, finalmente noto o quanto ele sentia falta da esposa. A cama de casal ainda está lá. As roupas dela ficam guardadas na última gaveta do armário manequim 40 e gosto estranho. Há um kit de beleza próximo ao espelho. Péssimo perfume odeio Nostalgia. Continuo revirando os objetos pessoais do casal por uma hora. Encontro a carteira de taxista de Roger Joseph Ackroyd. Vencida."
"Como um taxista conseguiu se mudar para o Fortuna?"
"Ainda confuso por tantas questões, decido fazer logo a visita à mulher de Ackroyd. Chego à nova moradia de Amanda por volta de uma da madrugada. Infelizmente, tenho de visitá-la como Questão. Levantaria suspeitas se Vic Sage aparecesse lá neste horário. E, se o cérebro de Izzy funcionasse, perceberia a coincidência da visita a ele e à ex-senhora Ackroyd."
"Ela mora num pequeno apartamento de um bairro pobre. Fim decadente para a esposa do taxista mais rico de Hub City. Como não a conheço, prefiro bater na porta a assustá-la. Uma mulher sonolenta abre a porta e seus olhos arregalam-se ao ver meu rosto. Ou a falta dele."
Você não é aquele herói da cidade? O cara sem rosto que sempre falam no noticiário? Questão, é isso?
Isso mesmo. Vejo que achou meu rosto... familiar. Preciso falar com você. às vezes, as pessoas desmaiam ou fogem, mas Amanda me surpreende e não se assusta com minha presença Hã... você é Amanda Ackroyd?
Voltei a me chamar Amanda Green. Você veio falar sobre Roger? ela abre a porta e me permite entrar Já lhe digo que estava em casa na hora do crime. Minha vizinha Anne confirmou. E não pense que sou uma mãe ruim, me proibiram de visitar Ira por enquanto. Quer suco? Não ofereço outra coisa porque estou fazendo dieta, sabe?
Não, obrigado. sento-me numa cadeira e observo a casa. Muito pobre. Estranho Há quanto tempo não via Roger, srta. Green?
Pode me chamar de Amanda. Há uns três meses. Desde que... o deixei. Engraçado, nós brincávamos que um dia ele morreria assassinado, e então...
Brincadeira mórbida. Não achei muita graça.
Desculpe, achei que ia entender. O pai de Roger se chamava Robert Ackroyd e era fã da Agatha Christie. O batizaram assim em homenagem a um dos livros dela.
Entendi. finalmente, pego a referência. Terrível coincidência Por que o deixou?
Problemas, problemas. ela esconde algo. Claramente As pessoas sempre disseram que nós não daríamos certo. um sorriso amarelo para disfarçar a tristeza e um segredo Eu, gorda, e ele, magro do jeito que é. Não tinha nada a ver.
"Preciso saber o que ela esconde. Se não for direto, não saio do lugar neste caso. É óbvio que Ackroyd tinha uma amante e por isso ela o deixou. As roupas tamanho 40 podem ser uma prova. Ou então, ela engordou e o marido não quis mais transar com ela. Isso explica o 'sexo ruim' que Ira citou. Finalmente esse caso está andando."
Cheiro bom. pergunto como se não soubesse Carpe Diem?
Isso mesmo. Meu perfume favorito. Para alguém que não tem nariz, você se saiu bem.
Faz parte do meu show. ou ela melhorou incrivelmente seu gosto para perfumes ou outra pessoa usava aquele Nostalgia. Chega de jogar conversa fora, preciso ser duro Não minta, Amanda... Roger Ackroyd tinha amante?
Tinha. O suficiente para eu me separar dele. o rosto dela se entristece terrivelmente Por favor, pare com essas perguntas. Respeite a memória do meu marido.
"Não posso ceder. Não agora que estou tão próximo. Se não chegar ao fim do mistério, terei que agüentar minha mente criando milhares de teorias. E voltarei aqui para saber, de qualquer jeito. Não posso ceder. Por que Ira matou o pai? De onde vem o dinheiro de Roger Ackroyd? Quantas amantes ele tinha? O que Amanda esconde? Preciso saber."
Ira matou o pai porque ele estava vivendo com uma amante.
Deus! Você é doente? a idéia a atinge como um raio. Ela começa a chorar cada vez mais. Posso ter ido longe demais, afinal. E, sim. Talvez eu seja doente De onde tirou essa idéia?
Vi roupas femininas que não são suas em sua antiga casa. não tenho mais tempo a perder De onde vem o dinheiro de Roger Ackroyd?
Você não gostaria de saber... ela responde, de forma tão intrigante que é impossível eu não querer saber Você pode ser brilhante como herói, mas este não é um caso convencional. Acredite.
Não me vejo como um herói. Muito menos um convencional.
Pois bem. ela vira o rosto, escondendo as lágrimas Ira matou Roger por vergonha da profissão do pai.
Vergonha por ele ser taxista? Isso não explica muito.
Taxista? Antes fosse. A resposta para o caso se resume em uma palavra, senhor Questão. desta vez, ela olha para mim. Por um segundo, ela parece sorrir, mas volta à expressão séria Roxxane.
"Eu a encaro por uns dois minutos, em silêncio e estupefato."
Se Roger não vivia com uma amante, tente imaginar de quem eram as roupas.
Entendo.
"Amanda faz uma piada do tipo 'você precisa ver sua cara de bobo', mas nenhuma piada se compara à peça-chave deste caso. Ira matou o pai por vergonha, depois de descobrir de onde vinha o dinheiro da casa e porque a mãe deixou a família. Roger Ackroyd não trabalhava como taxista à noite. A grana vinha de seus amantes. As roupas femininas não eram de Amanda ou outra mulher."
"A resposta não justifica o que Ira fez, mas explica. Pelo menos eu estava certo quanto aos motivos do garoto, mesmo que não valha a pena contar para Izzy que eu tinha razão. A sensação que tenho é que todo este caso parece uma imensa piada de mau gosto, do início ao fim."
Hã... constrangido, me levanto Obrigado, senhorita Green. Pode ter certeza que respeitarei a memória de Roger.
"Em silêncio, deixo a mulher, visivelmente perturbada pelas lembranças do casamento. Deve ter sido terrível descobrir algo assim. Retiro a máscara logo que me aproximo de casa. E uma maldita música não sai da minha cabeça. Droga."
"Valeu a pena descobrir algo como isto? Se continuar assim, daqui a pouco estarei tentando descobrir o motivos que levaram Roger Ackroyd a se travestir. Preciso dar um jeito nesta minha necessidade."
Tot? acordo meu velho amigo no meio da madrugada, assim que entro em casa.
O que foi, Vic? ele bem abre os olhos, angustiado por acordar às cinco da manhã Que horas são?
Só queria saber se você ainda tem aquela coleção de livros de mistério...
"Talvez eu possa direcionar minha curiosidade em algo mais útil. Por exemplo, descobrir como termina a história do homônimo famoso de Roger Ackroyd."
"Preciso saber."
:: Notas do Autor
Depois de muito pensar num nome para nossa singular vítima, cheguei à conclusão que seria interessante homenagear um dos melhores livros de detetive que já li: "O Assassinato de Roger Ackroyd", de Agatha Christie. Saibam que a resolução do caso é bem mais surpreendente e interessante que este conto, além do que o mistério é completamente diferente. Vale a dica de leitura. Aliás, essa edição é cheia de referências bobas, mas espero que gostem e encontrem.
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