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Tucão # 03

Por Matheus Pacheco

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"Um antigo patrão meu costumava dizer que pôquer é como a vida e que tudo o que você precisa é saber o que as pessoas realmente querem dizer quando dizem alguma coisa. Ou algo assim. Eu acho."

"Mas eu sei lá. Não acho, não. Pôquer é bem mais divertido que a vida. Aqui a gente tem de ter honra se quiser ir adiante. E se alguém te pegar trapaceando, você tá fodido. Na vida não, dá pra fazer o que quiser se tiver cara de pau o suficiente."

"Aqui estou eu, uma roda de cinco caras desconhecidos, em um boteco mais que conhecido. Eu devo jogar aqui no Louie's há uns dez anos. Sempre tiro uma graninha que dá pra pagar a vagaba do fim de semana. Sabe, né? Puta não incomoda muito depois da trepada. Além do mais eu não sou nenhum don Juan, então fica meio brabo descolar uma xoxota."

"Estou na mesa com mais quatro amadores e um baixinho que manja tudo de pôquer. A gente meio que tá dividindo a grana dos otários. Tá até divertido, mas o carinha me mete medo e eu nem sei porque. Ah, pro diabo com o medo, o que vale é que eu tou tirando uma grana legal, vai dar até pra matar uma pizza amanhã à noite..."

"Louie continua distribuindo as cartas. Ele faz isso todas as sextas já há uns vinte anos. Eu acho que o sujeito precisa de uma disposição do caralho pra ficar só olhando os caras jogarem e não poder se meter. É que nem ser câmera de filme pornô, só olhando e registrando. Como eu sei? Eu já fui os dois: crupiê e cameraman. Porra, eu acho que já fui de tudo na vida, até honesto. Sei lá..."

— Vamo lá, xará! Tamos esperando você.

— Hã? Desculpa, eu tava viajando. Quero... ahnnn... duas.

— Tomaí.

— Valeu, Louie...

"O esquema do jogo é você decifrar tudo sobre os outros e não deixar que eles saibam como você está. E isso tá longe do tradicional "faço-cara-de-triste-quando-tenho-carta" dos amadores. É como pescar em mar aberto, você às vezes tem que dar linha pro peixe cansar. Aqui, às vezes você tem que dar uma ou duas rodadas pro otário se empolgar. Além do mais, ele acaba achando que conhece você."

"Isso aqui é jogo pra homem."

— Ponho dez mangos.

— Eu tou fora.

"O otário ali fez bem em fugir. Tá nítido que o irlandês ali tem coisa na mão. Azar o dele que eu tenho mais. Eu acho..."

— Eu fico. Teus dez e mais cinquinho, só pra alegrar a galera.

— Pra mim tu tá blefando, xará! Pago pra ver.

— Fora.

— Fora também, vou mijar.

"Ficamos só nós três. Eu, o baixinho e o irlandês. Eu sei que o galego tem coisa e com certeza vem nos meus cinco mangos, mas o nanico não dá mole pra descobrir, não."

— Eu pago pra ver.

"Bingo! Eu tenho um full na mão. Três valetes e dois reis. Praticamente uma família real."

"Na mesma hora, os dois ficam putões. O irlandês esmurra a mesa e xinga minha mão de tudo o que é palavrão. Este baixinho. Sei lá... Quando eu tou pegando a grana fico olhando pra cara dele e parece que o cara tá transfigurado, rosnando e rangendo os dentes. Porra, parece um bicho!"

"A gente continua jogando, comigo e o anão revezando as mesas. O irlandês vez por outra descola uma por mérito (sem contar as entregadas) e os outros três vão apanhar da mulher esta noite."

"É quando o grandalhão com a camisa de lenhador começa a ganhar e falar alto, a beber demais e ficar confiante demais. Aí tem truta. Deu pra notar que o meia-bomba também manjou o magrão e tá de olho nas mãos do sujeito. Isso vai dar merda."

"Até que..."

— Porra, cara! Que merda é esta? De onde tu consegue três ases se eu tenho uma dupla?

"Bah, amador... Nem quando era moleque eu roubava deste jeito. Quero só ver no que vai dar. Não tou a fim de me meter, não. Depois desta semana e dos malucos fantasiados, tudo o que eu quero é um pouco de calma e tranqülidade. O lenhador reage."

— O que tu quer, baixinho? Vai encarar, é? Tá achando que eu vou arregar pra um esquilo peludo?

— Ah, agora tu vai ver quem é o esquilo peludo, xará!


"Peraí! Que diabos é aquela porra saindo da mão do cara e indo em direção ao saco do Rufus? AGH! Uma garra! O filho da puta tem garras! Até nas horas vagas estas merdas me perseguem!"

— É o seguinte, xará. Agora eu quero ver tu cacarejar que nem uma galinha choca pra aprender a ser um pouquinho mais humilde.

"Eu olho em volta e vejo o galego bem calmo num canto, quase rindo. Os outros dois figuras que estavam jogando com a gente estão escondidos com o Louie atrás do balcão. Eu? Eu tô preso num canto do salão. Atrás de mim, a parede. Na minha frente, um chorão tendo os bagos ameaçados por um cara que parece uma cruza de kiwi com estilete."

"Merda. Merdamerdamerdamerdamerda. Eu odeio isso. Quando eu mais acho que tá tudo indo bem, que eu tou na boa, aparece um bosta destes pra me estragar a noite. Agora eu tô aqui tremendo, suando e pensando de que jeito que eu saio vivo de perto deste psicopata."

O lenhador:

— Porracaramedesculpaeutavasótentandodescolarumagranapracomprarumpresentepraminhafihaporqueéani versáriodelaeeuqueriadar...

Calaboca, porra! Toma aqui, são 30 pilas do que eu e o Cassidy ali ganhamos. Vai comprar uma Barbie pra tua guria e nunca mais pisa aqui, tá certo?

— Tábrigadovocênemfazidéiadoquantoissoéimportantepramimporqueeuamodemaisaminhafilhae...

Vai, porra!

"Cara, eu não acredito que o mané peludo caiu nesta lorota idiota de presente pra filha. Bom, pelo menos ficou tudo calmo e eu vou tranqüilo pra casa ago..."

— E você, xará?

— AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!

"Agora eu morro. O cara continua com ódio pra caralho. Porra, fodeu."

— Q-q-que foi, senhor?

— Tu joga pra caralho, mas da próxima vez não vai ganhar tão fácil assim. Falou.

— F-f-falou, senhor.

"O peludo e o irlandês saem. Os outros dois e o Louie dão um puta suspiro e saem de trás do balcão. O Louie não pára de dar graças a Deus porque o boteco não foi destruído desta vez."

— Qualé, Tuc? Não vai levantar desse canto, não? Vamos tomar uma pra relaxar."

"Mas eu não consigo. Uma sensação com a qual eu estou ficando acostumado tomou conta de mim de novo. É... Hoje eu posso dizer que peido pesa, sim..."

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