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Por
Matheus Pacheco
Escalpos Secando
ao Vento na Noite Fria do Texas
Parte I
Sonho com árvores.
Árvores espalhando-se ao infinito por sobre tapetes enormes
da mais verde grama, digna de um campo de golfe onde velhos barrigudos
e opressores teimam em deslocar seu ombro enquanto decidem
por questão de humor (ou falta de) os destinos de
milhares de famílias miseráveis.
"Jennie..."
Sonho agora com um lugar cinza. Pedras por todos os lados. Pedras
cobrem todo o meu corpo e dos meus colegas/vizinhos/companheiros.
Somos todos negros cumprindo penas injustas. Este é o lugar
pra onde fui mandado por não ter feito nada de mal na vida.
Minhas horas são preenchidas por inúmeras conversas
metafísicas e letra de raps engajados.
"Jennie..."
O céu. Azul. Não, verde. Sonho com um céu
esverdeado, nuvens passam velozmente por mim parado. Sonho
com liberdade, sonho. Apenas sonho e todas as imagens fluem por
minha cabeça tal como em um videoclipe qualquer. Não
consigo acordar. Não consigo me mover. Apenas sonhar, sentir
o sonho passar por mim, sentir as coisas acontecer.
"Jennie..."
Acordo. Abro os olhos e fecho-os rapidamente. Não consigo
enxergar nada. A luz muito forte me ofusca. Ouço vozes
ao meu lado. Duas. Uma é ríspida, áspera,
marcada pelos anos e sábia ao extremo, a outra é
suave, curveada, marcada pela alta carga de sentimentalismo. Me
ancoro na segunda.
Homem-estrela? Olá? Acorde...
Não consigo raciocinar direito. Consigo me lembrar quem
sou. Como pode ser que ela saiba quem eu sou? Não estou
mais em Opal, eu acho. Não consigo lembrar direito...
Tento novamente abrir os olhos. A claridade me ofusca outra vez.
Merda. Onde diabos eu estou?
Durmo e volto a sonhar. Tudo é verde. Jennie...
Sonho com crianças morrendo de câncer, sangrando
pela boca enquanto choram desesperadamente. Sonho com mães
dando à luz bebês deformados, mal-formados. Sonho
com maridos espancando suas esposas por motivo algum, apenas para
arrependerem-se minutos à frente. Sonho com japoneses sendo
atomizados pela onda de calor solta por um garotão. Sonho
com vacas babando enquanto seu cérebro vira esponja. Sonho
com extremistas destruindo legados culturais da humanidade apenas
por diversão. Sonho com crianças verde-escuras perdendo
seus clitóris em obscuros rituais.
"Jennie... Onde...?"
Acordo novamente. Desta vez não tento abrir os olhos, apenas
ouço tambores ritmados como os batimentos cardíacos
de um bebê prestes a nascer. Lembro de quem deixei para
trás, de quem me deixou para trás. Dave, mãe,
pai. Jennie, meus amigos, Michael...
Penso em Jennie. Pela primeira vez em muito tempo (Quanto tempo?
Dias? Horas?) consigo prender a concentração em
algo/alguém.
"Jennie..."
Penso nela. Seus olhos, cabelos. Lembro-me de sua voz. Sua pele.
Seus lábios.
Como pude? Como pude aproveitar tão pouco?
Penso em Jennie e pela primeira vez penso em futuro.
Caio no sono novamente...

"Jack, por onde
você deve estar a uma hora destas? Já há 3
dias não recebo notícias suas. Apesar de parecer
muito cedo, eu queria estar em seu colo, queria estar dizendo
que amo você, queria estar sentindo seu toque. Onde você
está?"
"Tenho que encontrá-lo, não sei como. Não
sei se devo."
"O que faço?"
"Olho para o telefone. De que adianta? Vou ligar para a polícia
botar uma foto dele em caixas de leite?"
"Olho para a janela. Meu impulso é correr atrás
dele, me jogar em direção ao nada à procura
de quem amo. Mas para onde ir?"
"Será que estarei traindo a confiança de Jack
pensando em procurá-lo contra a sua vontade? O que ele
diria se me visse agora?"
"O telefone. James, ele deve ter um jeito de encontrar Jack,
ou ao menos seu bastão."
"Devo?"
"Não devo?"
:: Notas
do Autor
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