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Arqueiro Verde # 03

Por Cesar Rocha Leal

Arqueiro Verde e Amarelo

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Rio de Janeiro, Brasil — 9h43

Uma linda manhã de sol encontra Oliver Queen dirigindo um carro alugado pela Linha Vermelha após uma longa viagem de avião desde os Estados Unidos. Um péssimo vôo, comida ruim e total incapacidade de entender a língua portuguesa não fizeram muito para deixar o Arqueiro Verde menos tenso. Até porque ele achava que se falava apenas espanhol na América Latina.

A pista que seguiu atrás dos criminosos Holsfield, seu braço direito Horace Starker e sua rede de tráfico de garotas e prostituição infantil o trouxe até a Cidade Maravilhosa, mas não sem algumas precauções. Viajando incógnito e sem seu equipamento — já que a última coisa que queria era chamar a atenção de sua presa ao ser revistado na alfândega — Oliver só trouxe um arco de madeira e algumas pontas de flecha em um arranjo de chaves. Alugando um carro para se locomover, ele ainda cometeu uma pequena gafe...

"Como eu iria saber que a palavra 'motel' tem outro significado em português? Eu pensei que seria uma pousada de estrada como nos EUA! Motel Sales... Droga. E ainda por cima, tive de agüentar risadinhas daquele gordinho filho do dono...", pensa o Arqueiro ao se dar conta que vasculhar uma cidade estranha atrás de uma pessoa não seria tão fácil quanto imaginou originalmente. "Bem, tenho que passar em uma casa de esportes e comprar algumas flechas industrializadas, apenas por precaução. Depois, achar uma madeireira para comprar varas de madeira de qualidade e fazer minhas próprias flechas confiáveis com as pontas que consegui trazer. Em seguida, achar um hotel barato para não chamar a atenção..."

Então, uma idéia passa pela mente do Arqueiro. Se ele quer pistas sobre o turismo sexual mantido por Holsfield, nada melhor que aparentar ser um cliente. Bem, isso vai raspar sua conta bancária, mas Oliver passa a procurar um hotel de nível internacional.

O salão do tradicional hotel Copacabana Palace é extremamente luxuoso. Sua construção de apenas dois andares situada em frente a uma das mais famosas praias do mundo cobra um alto preço de seus hóspedes.

É nesse ambiente que chega um Oliver Queen falando um inglês com um leve sotaque alemão, meio fajuto, mas aceitável. O carregador leva as malas enquanto mantém uma agradável conversa com seu interlocutor.

— Pois é sua primeira vez no Rio, certo?

— Primeirra vez no Brrasil. Para ser exata.

— Tenho certeza de que vai gostar. E, no que depender do staff do nosso hotel, tenho certeza de que será bem atendido.

— Parra falar a verrdade, gostarria de saber algo. Terria como ser arranjado uma companhia feminina? Sabe como é, as garotas brrasileirras tem fama...

— Claro, basta eu saber o seu... hã... gosto preferencial, que te passo um telefone.

— É clarro. Gostarria de uma garrota meio novinha, sabe?

— Perfeito, tenho um tio que pode ajudar. As garotas dele são universitárias e a partir de 18 anos...

— Não, não... Você não entendeu exatamente. — fala o Arqueiro passando uma nota de cinqüenta dólares para o carregador. — Eu querro uma novinha. Bem novinha...

— Sei. Acho que tenho o que você quer. Mas a transação não pode ser feita no hotel. Ligue para este cara. O nome dele é Rique. Ele pode arranjar o que você quer.

— Perrfeito. Vou fazer isso.

— Ah! Quando o senhor falar com ele, diz que fui eu que te mandei. E, por favor, manda ele a merda por mim, tá? É uma brincadeira do pessoal...

— Cerrto.

Oliver fica só no quarto. Ele tem algum tempo até a noite para começar a procurar sua presa, e torce para que este contato possa levá-lo a Holsfield. Mas, até lá, ele precisa fazer suas flechas. Tendo conseguido varetas aceitáveis, Oliver abre a janela do quarto e senta em frente a ela, observando o mar e ouvindo os sons da cidade desconhecida, os banhistas, vendedores ambulantes. Ele acredita que a tarde passará rapidamente.

Enquanto usa as pontas contrabandeadas para fazer flechas em que pode confiar, ao contrário das que comprou na casa de aparelhos esportivos, apenas uma pergunta fica em sua mente ao ouvir os sons na língua que desconhece: "Que diabos será um biscoito Globo?"(*)

20h37

O tal do Rique falou tudo que sabia. O Arqueiro deixa o apartamento do criminoso, que está amedrontado e devidamente amarrado. Tendo uma noção de sua próxima parada, percebe que foi uma sorte ter resolvido alugar o carro. Antes de sair, porém, ele lembra de algo e se vira para o homem.

— Ah, sim, já ia me esquecendo do recado... Rique, vá a merda.

03h47

A madrugada é fria na estrada que leva à Floresta da Tijuca. O Arqueiro analisa a casa em que pode estar seu alvo. Foi uma longa noite subindo os degraus da marginalidade até achar alguém que conhecesse Richard Holsfield. Mas sua busca parece ter finalmente rendido os frutos desejados. Ao analisar os arredores do casarão, ele reconhece uma figura ao longe. Trajando casaco e boné azul marinho, outro homem também mantém vigília à casa de Holsfield. Mas o que faz o Arqueiro reconhecer a figura é seu rosto, ou mais precisamente, sua falta de rosto.

Se aproximando sorrateiramente, Oliver fala com a figura agachada aos pés de uma árvore.

— Meio longe de casa, não?

Vic Sage, o vigilante mais conhecido como o Questão, se assusta com o recém-chegado, mas relaxa rapidamente ao reconhecer o antigo aliado.

— Arqueiro? Mas o que você está fazendo aqui?

— O mesmo que você, acredito: caçando. Richard Holsfield mora nesta casa. O sacana faz turismo sexual e tráfico de garotas entre Seattle e o Rio de Janeiro. E você?

— Estou atrás de um amigo dele, que está hospedado na casa. Ele roubou... algo. E vim pegar de volta. Na verdade, estou fazendo um favor a um amigo.

— Certo. Mas já que vamos para o mesmo lugar, podemos comparar anotações. O que você viu?

— Nenhum alarme silencioso. A casa tem três vigias na parte de baixo, sendo um deles o caseiro, que além de armado está acompanhado por dois pit bulls. Tem um cara no teto com uma arma pesada e mais três dentro da casa, dentre os quais minha presa, Holsfield, e seu guarda-costas.

— Horace Starker. — vocifera o Arqueiro, lembrando de seu combate, ainda em Seattle, com o assassino de sua informante.

— Esse mesmo. Confere com o que você descobriu?

— Sim. Mas acho que primeiro temos que cortar o telefone.

O Arqueiro mira na fiação telefônica que sai da casa. Pega uma das flechas que comprou, arma o arco e atira. O disparo é certeiro, mas a flecha apenas resvala no fio sem cortá-lo.

— Ei! O Arqueiro está "perdendo o toque"?

— Nah! O problema é que usei uma flecha "profissional". Não gosto destas coisas industrializadas. Esperava poupar as flechas que eu mesmo fiz para situações mais perigosas, já que são únicas em que posso confiar.

Oliver usa uma de suas flechas e o disparo mais uma vez é perfeito, com a diferença de que o alvo é acertado e o fio, partido com facilidade.

— Bem melhor. — diz o Questão — E agora? Você cuida do cara no teto? Deixe os cachorros comigo, não quero matar animais se não houver necessidade.

— Entendo.

Mais uma vez o Arqueiro utiliza uma de suas próprias flechas. O disparo acerta o rifle, deixando a arma inútil. Os dois heróis adentram na casa. Sage parte para onde se encontra o caseiro com os cães, enquanto Oliver enfrenta os dois vigias. A seta desarma um deles, deixando Queen livre para se concentrar no outro, acertando-o no ombro.

— Quem diabos é você? (**)

— Eu não falo seu idioma, amigo, mas acho que podemos nos entender. Já ouviu falar em vodu? Aquela negócio de enfiar agulhas em bonecos, fazendo a vítima sentir uma grande dor? Pois é, eu faço a mesma coisa, só que sem agulhas. E sem bonecos.

O Arqueiro aponta uma flecha para a cabeça do bandido. Mesmo sem entender o que o herói falou, eles compreendem a mensagem e se entregam. Enquanto parte para amarrar os adversários, Oliver verifica Sage.

O Questão está de pé ao lado de dois cachorros desacordados. Pisando no pé do caseiro para lhe tirar a mobilidade, o Questão atinge o rosto do homem, deixando-o inconsciente e quebrando alguns dentes no processo.

— Droga, queria ter visto o que você fez com os cães. Poderia ter sido útil.

— Segredo profissional, meu caro.

Um disparo passa perto do Questão. O vigia que estava no teto conseguiu uma pistola e tem o vigilante em sua mira. O Arqueiro dispara uma flecha sem sequer parar para analisar a situação. O disparo atinge o rosto do homem de raspão, fazendo-o cair do teto.

— Não que faça diferença, mas está vivo — fala o Questão — Belo disparo.

— Que nada. Acabei usando uma flecha "profissional". Nem vou dizer onde estava mirando... Malditas coisas mal feitas.

A dupla entra na casa. Na total escuridão, eles agem com cautela. Até ouvirem uma voz.

— Não. Devolva-me o ídolo. Arghhh...

Uma figura enorme desce as escadas e passa pelos heróis. Alguém que não estava na casa alguns minutos atrás.

— Droga, o cara roubou o ídolo! — Sage fala com rapidez enquanto parte em perseguição ao ladrão.

— Mas o que será que tem nesse ídolo para que todos estejam atrás dele? — resmunga o Arqueiro Verde. (***)

Na verdade o sumiço do Questão é benéfico ao Arqueiro. Ele prefere enfrentar Starker e Holsfield sozinho. Ao adentrar no salão com as escadarias para o segundo andar ele vê uma figura nas sombras. Prontamente, arma seu arco e aponta contra o homem.

— Não acredito que você queira que tudo acabe deste jeito, Arqueiro Verde. Temos uma valsa para terminar de dançar. — Starker fala lentamente enquanto larga a arma e pega sua faca.

A raiva sobe aos ouvidos do Arqueiro. Tudo que ele mais quer é enfrentar Starker. Mas desta vez ele não vai se deixar levar. Um disparo desarma o vilão enquanto que um segundo acerta o seu ombro.

— Acho que vamos ter que deixar para outra vez.

Ao se aproximar do adversário, Oliver nota que, na verdade, Starker não estava somente com a faca. Uma pistola pende de sua mão esquerda. Se tivesse desarmado seu arco, possivelmente levaria um tiro.

— Espertinho, hein? Vamos deixá-lo amarrado para podermos concentrar em seu patrão, certo?

O Arqueiro amarra Starker e, ao analisar sua aljava, percebe que não tem mais flechas próprias, somente as compradas. A seta usada para desarmar Starker está inutilizada. Percebendo isso, ele retira a flecha que acertou o ombro do criminoso.

— Economizando, não vai faltar...

Holsfield está sentado na escrivaninha de seu escritório, no segundo andar. Diante dele, ha um corpo caído. O homem que tinha o ídolo foi morto por aquele que o roubou.

O Arqueiro entra no escritório. Holsfield aponta uma pistola por baixo da mesa, mas anos de experiência ensinaram Oliver a esperar por este tipo de surpresa. Uma flecha atravessa a mesa de compensado fino, acertando a mão de Holsfield, que larga a arma. Mesmo sob grande dor ,ele ainda fala.

— Parabéns, herói. Você venceu. Mas será que a vitória é doce? Eu usei meu celular para chamar a polícia. Eles já estão quase aqui.

— Ótimo. Assim eles te dão carona para a cadeia.

— Há! Sob que alegação? A sua? Você invadiu propriedade privada. Atacou meus empregados. Se envolveu no assassinato de meu hóspede. E não tem qualquer prova contra mim. Eu sou um empresário americano, trazendo divisas para o Brasil e investindo no país. Você veio sorrateiro para o Rio e não pode fazer nada. Como vai ficar sua imagem para a Liga da Justiça? Eu sou intocável... Você não pode me vencer. Só te resta fugir antes da polícia chegar e sabendo que perdeu. Provavelmente não haverá pistas para que eu te acuse também. Portanto, acho que ficaremos no zero a zero. A não ser que você esteja disposto a me matar a sangue frio...

A raiva explode no rosto de Oliver Queen.

— É graças a parasitas como você que mazelas da humanidade continuam a assolar nossas vidas. Crianças usadas por velhos tarados, se submetendo a práticas nojentas por causa... Por causa...

O Arqueiro se aproxima de Holsfield. Suas intenções estão claras e suas mãos se aproximam do pescoço do empresário, mas antes de alcançá-lo uma garota entra no escritório. Oliver a reconhece: é a menina que ele não conseguiu salvar quando Holsfield entrou no avião ainda em Seattle (****). A visão da criança parece acalmar o Arqueiro.

— Vamos, garotinha. Titio Oliver vai te tirar daqui.

A menina se aproxima do Arqueiro. Ele a ampara ao sair da sala, após retirar a flecha da mão de Holsfield. Antes de sair, ainda diz:

— Vou levar a garota. Mesmo que a polícia a ligasse ao tráfico de crianças, você provavelmente iria abafar a situação. Talvez acusasse seu hóspede morto de ser usuário de prostituição infantil. Você é um merda, Holsfield. Não vale o trabalho que tive de tirar a flecha do ombro de Starker.

Os olhos de Holsfield se arregalam. Ele começa a balbuciar.

— Você acertou Starker com essa flecha? Com... essa... mesma flecha? Meu Deus! Horace era soropositivo! Isso significa que estou... estou... com AIDS! Você me matou Arqueiro! Você me matou!

Oliver deixa a sala. Ele acertou Starker alguns minutos antes de Holsfield e sabe que o vírus não pode sobreviver tanto tempo exposto ao ar. Mas não sente nenhuma vontade de explicar tal fato ao preconceituoso bandido. Ele deixa a casa levando a garota e deixando o empresário entregue aos seus delírios de morte quando as sirenes da polícia começam a soar no amanhecer.

No dia seguinte

Oliver anda pelo calçadão da praia de Copacabana. Um sorriso se forma no seu rosto ao pensar na criança que salvou. A pequena Talita poderá ter um futuro melhor agora. Graças ao transportador da Liga na Embaixada, ele pode mandar a garota de volta para os EUA sem chamar atenção, enquanto espera a hora de ir ao aeroporto pegar seu vôo. Afinal, sua saída do Brasil precisa constar em seu passaporte.

No jornal, a notícia do indiciamento de Starker no assassinato de Vilma, identificado pela faca que usava, deu ao Arqueiro uma sensação de dever cumprido. Holsfield se safou, como era esperado, mas continua paranóico com a idéia de morrer e não havia qualquer sinal do Questão nos arredores; no final o saldo foi positivo. Apenas a dúvida quanto a identidade do misterioso informante em Seattle ainda pairava nos pensamentos de Oliver Queen, enquanto ele constatava: "Não se trata de nenhum Chili apimentado, mas até que os tais biscoitos Globo são bem gostosos..."

Veja em Questão 15 esta aventura pelos olhos de Vic Sage.

:: Notas do Autor

(*) Biscoitos Globo são biscoitos de polvilho vendidos somente por ambulantes nas praias do Rio de Janeiro. A fábrica faz muito sucesso, mas seu dono mantém uma manufatura amadora e se nega a distribuir o produto em supermercados ou lojas. Todas as manhãs, vendedores cadastrados fazem fila em frente à fábrica para pegar o produto. De repente, comecei a sentir fome...
(**) Traduzido do português, já que o Arqueiro, como a maioria dos outros personagens do Hyperfan, fala inglês.
(***) Para saber o mistério do ídolo místico, leia a saga "Evolução" no título do Questão, também no Hyperfan.
(****) Edição anterior.



 
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